Novo embate sobre térmicas compradas por irmãos Batista envolve passivo judicial de até R$ 50 bi
Os irmãos Wesley e Joesley Batista, da J&F, donos da Âmbar Energia - Iara Morselli e Marina Malheiros - 20.mar.2024/Divulgação CNN Brasil
Cigás diz que negócio da Âmbar com Eletrobras só pode ser concluído após solução na Justiça; companhia do grupo J&F diz que negociação envolveu apenas ativos
André Borges
A compra das usinas térmicas da Eletrobras pela Âmbar, braço de energia do grupo J&F, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, ganhou um novo episódio de disputa, desta vez envolvendo acusações de um passivo judicial que chegaria à cifra de R$ 50 bilhões.
A acusação partiu da Cigás, distribuidora de gás encanado do Amazonas que é controlada pelo governo estadual e pela Termogás, companhia do empresário Carlos Suarez.
Em carta enviada à Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) na semana passada, a qual a Folha teve acesso, a Cigás diz que a venda das usinas da Eletrobras para a Âmbar, ocorrida em 10 de junho, só poderá ser confirmada após uma solução para todas as pendências judiciais que a Eletrobras detém não apenas com a companhia, que transporta o insumo por gasodutos, mas também com a Petrobras, que é a produtora do gás em si.
Segundo a empresa, há cinco processos em andamento na Justiça Estadual do Amazonas e outros dois na Justiça do Distrito Federal, com "estimativa do valor dos conflitos judicializados" de R$ 35 bilhões, envolvendo transações entre as empresas. Além disso, a Cigás afirma que haveria outros R$ 15 bilhões em "conflitos não judicializados", mas que podem desembocar nos tribunais.
"Sem a resolução adequada, precedente ou, ao menos, concomitante, das contingências contratuais e financeiras", diz a Cigás, "inviabilizada estará a conclusão e transferência dos contratos termoelétricos da Eletrobrás para a Âmbar".
A Âmbar arrematou 13 usinas térmicas da Eletrobras, sendo 12 delas no Amazonas, por R$ 4,7 bilhões. A transação já foi aprovada pelo Cade, faltando apenas um ato administrativo da Aneel e a conclusão de um processo de "due diligence" (análise de riscos) para ser efetivada.
"A concretização da transferência dos contratos termoelétricos originais somente poderá ser feita após, ou, ao menos, concomitantemente à resolução de todas as contingências (existentes e prováveis)", diz a Cigás, em documento assinado por seu diretor-presidente, Heraldo Beleza da Câmara.
Em linhas gerais, o imbróglio na Justiça mencionado pela empresa passa por discordâncias sobre cobranças de impostos, créditos em aberto e preços de serviços.
O pleito feito pela Cigás é mais uma reação da empresa sobre a venda das térmicas. A Termogás, que é sócia da Cigás, já monitorava a negociação das usinas da Eletrobras há mais de um ano e chegou a fazer uma oferta, que foi rejeitada.
Logo após o negócio ser sacramentado com a Âmbar, dos irmãos Batista, o governo federal também editou a MP (medida provisória) 1.232, fazendo com que a despesa com o gás das térmicas fosse transferida para a conta de luz de todos os brasileiros, além de estabelecer medidas de flexibilização no serviço de distribuição de energia elétrica no Amazonas.
Os apontamentos judiciais feitos pela Cigás causaram indignação na diretoria da Âmbar. Questionada pela Folha sobre a nova investida da empresa, a companhia dos irmãos Batista declarou que "a aquisição das usinas da Eletrobras pela Âmbar Energia envolveu apenas os ativos, sem caixa e sem dívida, conforme tornado público em fato relevante".
Segundo a empresa, "a transação não afeta qualquer alegado direito da Cigás e não altera as condições e riscos de seus negócios". A Âmbar faz menção ao que, segundo a empresa, seria pressão direta do empresário Carlos Suarez.
"A Âmbar Energia não cederá às seguidas pressões do empresário Carlos Suarez, que tenta criar dificuldades para obter vantagens após perder um processo competitivo privado e acirrado", declarou, por meio de nota. "Esta nova tentativa de Suarez de extrair benefícios de um negócio que não lhe diz respeito deve ter o mesmo destino de seus ataques anteriores contra os interesses da Âmbar: o fracasso."
A reportagem procurou Carlos Suarez na terça-feira (12). O advogado Roberto Podval, que representa o empresário, declarou nesta quarta (13), que Suarez está, no momento, em um barco, em local de difícil contato, e que não conseguiu contato com seu cliente. Disse que dará um posicionamento quando tiver retorno.
A Cigás declarou, por meio de nota, que "o posicionamento da Companhia está detalhado na correspondência" mencionada nesta reportagem, "de modo que não temos adições a fazer sobre o conteúdo nela encaminhado".
A empresa afirmou que tudo aquilo que consta na carta entregue à Aneel "foi explicitado à Eletrobras, ao Banco Morgan Stanley, e ao Exmo. Sr. Ministro de Minas e Energia (Alexandre Silveira), desde o ano de 2023, contudo, sem posicionamento das autoridades competentes até o momento".
Mais recentemente, declarou a Cigás, o documento foi levado ao conhecimento do Poder Judiciário Federal no Amazonas.
Embora a Petrobras seja citada pela Cigás como uma das empresas com ações na Justiça contra a Eletrobras, em um processo que remonta a valores de R$ 10 bilhões, a petroleira não impôs objeção à transação entre a Eletrobrás e Âmbar. Procurada pela reportagem, a Petrobras declarou que não iria comentar os apontamentos feitos pela Cigás. A Eletrobras também declarou que não vai se manifestar sobre o assunto.
Folha de S.Paulo
https://www1.folha.uol.com.br/mercado/2024/11/novo-embate-sobre-termicas-compradas-por-irmaos-batista-envolve-passivo-judicial-de-ate-r-50-bi.shtml