Setor de energia pode movimentar até R$ 120 bi em fusões e aquisições em 2025

Foto: Custódio Coimbra/Agência O Globo -
Segmento pode ter ano aquecido, mas cenário de juros mais altos, tensões geopolíticas, fator Trump e perspectiva de menor liquidez global traz incertezas
Por Robson Rodrigues, Valor - São Paulo
O setor de energia deve continuar puxando investimentos em fusões e aquisições (M&A, na sigla em inglês) em 2025, com uma estimativa de movimentar até R$ 120 bilhões, segundo projeções do banco suíço UBS BB. Além disso, são esperados recursos adicionais destinados a leilões de energia, reformas de empreendimentos operacionais, ampliação da capacidade produtiva e, em menor proporção, expansão da geração.
Por outro lado, um contexto de juros mais altos no Brasil, tensões geopolíticas ainda intensas e o fator Donald Trump, somados a possíveis revisões em políticas comerciais dos Estados Unidos e a perspectiva de menor liquidez global, trazem incertezas que podem impactar o fluxo de investimentos estrangeiros em países emergentes, como o Brasil.
Responsável pelo banco de investimento do UBS BB, Anderson Brito reconhece que, em uma perspectiva macroeconômica, a economia pode enfrentar maiores percalços em 2025. No entanto, ele destaca que alguns subsetores mais estratégicos, como o de energia, têm o potencial de se desvincular dessa tendência negativa e continuar registrando um volume expressivo de transações.
"Estamos esperando um aumento de 10% a 15% no volume de M&As de 'power utilities' [geração, transmissão e distribuição de energia elétrica] para o Brasil, que deve gerar um volume de cerca de R$ 50 bilhões. Em geração hidrelétrica, existem bons ativos no Brasil e 'players' estratégicos estão reavaliando seus portfólios e têm trazido transações importantes ao mercado. Em transmissão, existem gargalos, poucos ativos e alta demanda de mercado (...). Se incluir óleo e gás, estamos esperando um volume entre R$ 55 bilhões e R$ 60 bilhões em transações. Para o setor todo, a previsão é de movimentação de até R$ 120 bilhões", prevê Brito.
Entre as grandes operações, que ainda estão na mesa e podem acontecer em 2025, estão duas hidrelétricas à venda no Amapá pela portuguesa EDP.
A responsável pela área de pesquisa do Santander, Aline Cardoso, traz um importante contraponto sobre o ano que entra. Com previsão do banco de crescimento do PIB de 1,8%, taxa Selic de 14,5% e dólar em torno de R$ 6 para o fim de 2025, ela espera um período mais difícil para o mercado de ações. A executiva vê ainda um cenário de aceleração de resgates em fundos de ações e menor entrada de investidores estrangeiros.
"Temos o fator Trump, que tira liquidez de mercados emergentes. Também podemos ter uma guerra tarifária com a China, que acaba impactando o preço de commodities", diz. "Estou trabalhando em minhas estimativas com menos crescimento, mais inflação e mais juros, combinação que não é boa para o mercado de ações (...). Podemos ver também os bancos reduzindo apetite por crédito e redução de investimentos", acrescenta.
Apesar do aumento da curva de juros em 2024, os dados da RGS Partners reforçaram que o ano apresentou uma recuperação geral no mercado de M&A após a ressaca de 2023. Em energia, o ano foi marcado por importantes transações. Entre as principais operações, destacam-se a compra da AES Brasil pela Auren. Por cerca de R$ 7 bilhões, a transação criou a terceira maior geradora do país e uma das maiores comercializadoras do setor.
O responsável pela área de energia e infraestrutura da boutique de investimentos Araújo Fontes, Márcio Santiago, acrescenta que os leilões bilionários de transmissão continuam acontecendo e os projetos de geração seguem saindo do papel em razão de impressionantes 10 GW de capacidade instalada por ano nos últimos 2 anos.
Santiago acrescenta que da mesma forma, as consolidações em óleo e gás - sobretudo das empresas novatas - não deixaram de ocorrer, como a Brava Energia, companhia resultante da fusão entre 3R Petroleum e Enauta, e a cisão parcial da Azevedo&Travassos.
A Âmbar, braço de energia da J&F, destacou-se como a empresa mais agressiva em aquisições no setor. O grupo liderado pelos irmãos Batista tem um histórico de compra de ativos considerados pobres ou de baixo valor pelo mercado, mas que rapidamente se tornam rentáveis. Em 2024, a empresa adquiriu pequenas hidrelétricas da Cemig, usinas a biomassa da Engie, térmicas da Eletrobras e da Copel e expandiu sua atuação para a distribuição de energia.
Além disso, a J&F ingressou no setor de óleo e gás com a compra da Fluxus, com operações na Argentina, e da Pluspetrol Bolívia, ampliando sua presença no mercado de petróleo e gás na América Latina. "É nossa filosofia como grupo [olhar ativos e crescer de maneira inorgânica] e temos que estar preparados para que na hora da crise e dificuldades tenhamos oportunidade de crescer", diz o CEO da Âmbar, Marcelo Zanatta.
Apesar das incertezas do presente, o futuro pode ser melhor. O Plano Decenal de Expansão de Energia 2034 (PDE), da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), prevê investimentos acumulados de R$ 153 bilhões ao longo da próxima década apenas em energia elétrica para diversificação e integração da matriz. Para especialistas, as projeções para o futuro, principalmente no segmento de energia renovável, continuarão em destaque, especialmente com o avanço da agenda global de transição energética.
Exemplo disso é o movimento realizado pela Vibra ao adquirir, há alguns anos, 50% da Comerc, com a opção de compra da outra metade prevista para ocorrer entre 2026 e 2028. No entanto, Clarissa Sadock, vice-presidente de energia renovável da Vibra, explica que a empresa identificou valor estratégico em antecipar essa aquisição para fortalecer sua plataforma multienergia. O fechamento do negócio ("closing") está programado para 2025.
"O retorno financeiro foi vantajoso nesta aquisição, um momento de redução de risco com ativos construídos e contratados. São mais de 100 parques entre eólico, solar e geração distribuída", diz Sadock.
O diretor de "corporate and investment bank" do Banco do Brasil, João Fruet, ressalta que, apesar de o mercado de capitais estar mais parado, o segmento de energia descola com movimentos importantes de reciclagem de capital. A carteira do banco, nos vários segmentos de energia, ultrapassa R$ 30 bilhões, com perspectivas de crescimento puxado por grandes leilões de energia, retrofit e M&As.
"Os grandes grupos estão com uma posição confortável de alavancagem comparado com ciclos passados (...). Além dos leilões previstos para 2025, com boas expectativas de investimentos, existe uma necessidade de 'capex' [investimento] de manutenção elevada e M&As. Isso nos ajuda a enxergar uma contínua demanda do setor por financiamento", afirma Fruet.
O segmento de energia é intensivo em capital e reconhecidamente um dos que mais puxam investimentos. No acumulado dos últimos dez anos, apenas no setor de energia renovável, as fusões e aquisições chegaram a aproximadamente R$ 50 bilhões no Brasil, segundo a consultoria Clean Energy Latin America (Cela).
Camila Ramos, CEO da Cela, destaca que o ano deve movimentar um volume significativo de capital, impulsionado pela construção de projetos de autoprodução e geração distribuída de energia visando a entrada em operação dentro da janela regulatória. Além disso, ela ressalta o crescimento de iniciativas voltadas à demanda energética de data centers, projetos relacionados ao hidrogênio, e os efeitos positivos do programa Combustível do Futuro.
Valor Econômico
https://valor.globo.com/empresas/noticia/2024/12/29/setor-de-energia-pode-movimentar-ate-r-120-bi-em-fusoes-e-aquisicoes-em-2025.ghtml